sábado, 21 de julho de 2012

Sexta que vem


Não tinha como aquela sexta-feira ser o dia mais feliz.
Foi dia que voltei a pé, do trabalho para casa. Logo pela manhã, próximo ao escritório, meu carro deu um problema. Passei o dia sem carro e acrescentando mais uma despesa do mês.
Era impossível acreditar, que justamente numa sexta que meu carro quebra pela manhã, seria o dia mais feliz.
Por falar em mês, que mês terrível! Tudo por conta da mudança.
Após vinte e sete anos juntos, eu e minha esposa resolvemos comprar a casa própria e fugir do aluguel. Achamos uma bela casa com três quartos. Tudo que todos nós queríamos, falo isso por conta das crianças. Nosso filho mais velho, depois do nascimento da irmã, passou a exigir seu próprio quarto. Essa seria a hora de ter sua privacidade, já está com seus 14 anos, merece. E a pequena ficará no quarto próximo ao nosso.
Esse era os planos, mas não sabia que logo após a compra, a mudança e a felicidade de fugir definitivamente do maldito aluguel, as confusões iriam começar por conta da localização da casa.
Esposa e filhos reclamavam o dia inteiro:
“Temos que chamar um encanador pra dar uma geral no encanamento!”
“Pai, esse bairro é um lixo! Jamais convidarei meus amigos pra vir aqui nesse chiqueiro!”
E assim os dias passavam entre estresse no trabalho e em casa as reclamações.
Ninguém percebia que estávamos no nosso próprio lar.
Minha esposa não notava que agora iríamos economizar por mês o valor absurdo do aluguel.
Estavam todos assustados com o bairro, por ser humilde.
Não tinha como aquela sexta-feira ou qualquer outra sexta daquele maldito mês, ser feliz.
Caminhando pensativo de volta pra casa, percebo paisagens que jamais tinha notado e olhe que sempre passo nessa rua.
Nesse instante, lembro do carro quebrado e lembro que tinha acertado de pegar minha esposa no super mercado. Imediatamente, puxo o celular para avisá-la que estou sem carro e ele toca antes. Era ela, perguntando onde eu estava:
“Cadê você? To aqui sentada na escada da restaurante “Levity”, já ta chegando?”
Não tive como não desanimá-la com a noticia:
“Desculpa querida, mas estou sem carro. Ele parou de manhã, achei que seria algo rápido e não foi, mas faz o seguinte, pega um táxi e vai pra casa, devo chegar em 40 minutos, pois estou sem grana e a pé.”
Pra piorar a situação ela responde a mesma coisa:
“Também estou sem grana, a pé e cheia de sacolas do mercado! E aí?!”
Realmente estávamos sem grana. As pequenas reformas sugaram tudo que sobrou depois da compra da casa.
Sem opções, respondi já correndo:
“Ta bom! Em 15 minutos estarei aí. Beijo!”
Desliguei e continuei feito flecha cortando o vento em direção ao restaurante.
As pessoas me olhavam assustadas. Por que um homem de terno e gravada cruzaria tantas avenidas tão apressado?
Não tinha uma resposta exata para essa pergunta, apenas uma pequena certeza.
A clareza da resposta tive ao chegar à última quadra, uma rua reta que dava ao lado da escada do “Levity”.
Desacelerei os passos para recuperar o fôlego, quando ouvi a voz do Marquinhos:
“Mãe! É o pai!”
Ele disparou correndo, feito bala de revólver em minha direção.
Enquanto isso, minha esposa levantou do degrau onde estava sentada e ficou parada me olhando fixamente, e ao seu lado a Sophia de 4 anos, segurava uma pequena sacola plástica e perguntava puxando a calça jeans da mãe:
“É papai? É papai?”
Já abraçado de lado com o Marcos, sigo caminhando meio sem entender porque minha esposa estava parada.
Quem diria, logo essa sexta-feira, suado, sem carro, na rua com a família e as sacolas do super mercado, seria o dia escolhido.
Sophia correu em minha direção e antes de apanhá-la no chão pensei:
“Ah! Se as crianças estão felizes, não vou nem me preocupar com o que ela ta brava.”
Já a uns cinco segundos da mulher que me foi destinada, noto seus olhos repleto de lágrimas e passo a Sophia para os braços do irmão, enquanto a Cris abre os braços para mim...
Lágrimas escorrem no meio do nosso abraço e antes de conseguir perguntar qual o motivo, Cris me olha com olhos borrados, molhados e me diz:
“Eu te amo!”
Tentei responder a mesma coisa, mas fui interrompido quando as crianças nos abraçaram.
Então, dei um beijo pensativo em minha esposa:
“Por isso te escolhi para ser a mãe dos nossos filhos. Não importa o mês, o bairro, o carro ou a quantidade que carregarei de sacolas plásticas de super mercado. O que importa é o que sinto e te provarei isso dia após dia...
Até mesmo sexta que vem.


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